sábado, 29 de novembro de 2014

O amor que não veio


Se acaso penso em ti, me inquieta o pensamento.
por que havias de vir assim tarde demais?
bem que eu tinha de há muito um cruel pressentimento,
- e há sempre um desespero em nós,
se num momento
desejamos voltar a vida para trás.

neste instante imagino o que teria sido
o meu vago destino desorientado,
se antes, eu já te houvesse um dia conhecido,
a esse tempo, meu Deus!...- e esse tempo perdido
pudesse ao teu convívio ter aproveitado!

não há nada entre nós, nada. e em verdade há a vida
que nos chama e nos prende!. e já agora imagino
que aqui estás ao meu lado a ouvir-me comovida
e me entregas a mão, - e entrego-te vencida
a minha alma, - e com ela todo o meu destino!

não há nada entre nós, - mas se nos encontramos
ouvirás de hoje em diante um poema onde tu fores,
- trouxemos o destino estranho de dois ramos,
separados, - que importa? ainda assim nos juntamos
confundindo as ramagens, misturando as flores.

e eu nem te vi direito! um olhar sob um véu,
(há qualquer coisa estranha num olhar velado.)
- um olhar, - não direi que em teu olhar há um céu,
quando sei que afinal há tanta angustia e fel
em tudo o que me tens da vida revelado!

acompanhei-te o vulto um segundo, alguns passos,
nada mais, e no entanto, se quiser pensar
sou capaz de te ver, (há gestos nos espaços,
e guardei a visão dos teus braços, - teus braços
guardei-os, como dois clarões dentro do olhar!)

e devem ser macias as tuas mãos, - não ouso
pensar no que elas guardem nos seus finos dedos,
- pensando em tuas mãos, penso em sombra, em repouso,
num lugar quieto e bom, e num vento amoroso
a soprar entre as folhas múrmuros segredos.

mas. que saibas perdoar estas coisas que escrevo,
pensei-as a escutar distante a tua voz,
e há algumas coisas mais, que a dizer não me atrevo,
é que escrevo demais, e não posso, e não devo,
e não tenho o direito de falar de nós.

J. G. de Araújo Jorge

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