Disse o Leão:
- Nem um boi. Nem ao menos um
paca. Nem sequer uma lebre. Nem mesmo uma borboleta, como hors-d'oeuvres de uma
futura refeição.
Caiu estatelado no chão, irado
ao mais fundo de sua alma leonina. E, do chão onde estava, lançou um olhar ao
rato que o fez estremecer até a medula.
" A amizade resistiria à
fome?" - pensou ele. E, sem ousar responder à própria pergunta,
esgueirou-se pé ante pé e sumiu da frente do amigo ( ? ) faminto. Sumiu durante
muito tempo. Quando voltou, o Leão passeava em círculos, deitando fogo pelas
narinas, com ódio da humanidade. Mas o rato vinha com algo capaz de aplacar a
fome do ditador das selvas: um enorme pedaço de queijo Gorgonzola que ninguém
jamais poderá explicar onde conseguiu ( fábulas!). O Leão, ao ver o queijo,
embora não fosse animal queijífero, lambeu os beiços e exclamou:
- Maravilhoso, amigo,
maravilhoso! Você é uma das sete maravilhas! Comamos, comamos! Mas, antes,
vamos repartir o queijo com equanimidade. E como tenho receio de não resistir à
minha natural prepotência, e sendo ao mesmo tempo um democrata nato e
confirmado, deixo a você a tarefa ingrata de controlar o queijo com seus
próprios e famélicos instintos.
Vamos, divida você, meu irmão!
A parte do rato para o rato; para O Leão, a parte do Leão.
A expressão ainda não existia
naquela época, mas o rato percebeu que ela passaria a ter uma validade que os
tempos não mais apagariam. E dividiu o queijo como o Leão queria: uma parte do
rato, outra parte do Leão. Isto é: deu o queijo todo ao Leão e ficou apenas com
os buracos. O Leão segurou com as patas o queijo todo e abocanhou um pedaço
enorme, não sem antes elogiar o rato pelo seu alto critério:
- Muito bem, meu amigo. Isso é
que se chama partilha. Isso é que se chama justiça. Quando eu voltar ao poder,
entregarei sempre a você a partilha dos meus bens que me couberem no litígio
com os súbditos. Você é um verdadeiro e egrégio meritíssimo! Não vai se
arrepender!
E o ratinho, morto de fome,
riu o riso menos amarelo que podia, e ainda lambeu o ar para o Leão pensar que
lambia os buracos do queijo, E enquanto lambia o ar, gritava, no mais forte que
podiam seus fracos pulmões:
- Longa vida ao Rei Leão !
Longa vida ao Rei Leão!
MORAL : Os ratos são
iguaizinhos aos homens.
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