No fim da tarde daquele dia inesquecível de
1955, atravessei a estrada que passava entre a nossa casa e o rio, cruzei o rio
e subi a montanha. Chegando ao topo, sentei-me debaixo de uma das buganvílias
de flores vermelhas que existiam lá, para olhar a planície que se estendia e se
perdia entre árvores espaças e capim colonião. Mais adiante, na linha do
horizonte, o dia morria e, lentamente, sumia, como se fora um segredo esquecido
da tarde, que a montanha teimava em não revelar. Então, com o coração todo enfeitado de
sonhos, divisava o horizonte da minha vida, para o tempo poder passar.
Eu era feliz no meu mundo encantado de
tenra idade. E via a magia do dia pela linha do horizonte, como se fora o
último suspiro da tarde, ante o soluço da escuridão. Era como se contemplasse minha vida pelo
espelho da vida da própria vida, através da alma encantadora da montanha. E meu
coração sangrava de felicidade.
No mundo dos meus sonhos, o voo gracioso e
o cantar alegre dos pássaros, eram como setas incendiadas penetrando meu
coração pequenino, inflamando-o de admiração pela vida, em êxtase de alegria.
Era como se a vida descobrisse a vida, pelo
voar gracioso e pelo cantar alegre dos pássaros, e pelas pétalas de flores
vermelhas das buganvílias, que caiam e morriam no chão, mas resplandecentes de
luz.
Era
como se abraçasse a solidão dos caminhos e os caminhos da solidão e morresse
extasiado de amor, sob as estrelas e o luar, em um momento único e sublime da
vida. Ficava deslumbrado pela beleza das distâncias e pelo lamento dos anos que
vinham e iam, e passavam diante de mim, como num sonho continuado da vida, que
pedia para não morrer.
Eu vivia e sonhava debaixo da buganvília de
flores vermelhas, para ver o horizonte dos dias de todos os dias, com o vento
soprando pelos caminhos.
E hoje, ao recordar os anos maravilhosos da
minha infância, naquele canto esquecido do mundo, de saudade vou morrendo aos
poucos. Mas, o conforto é que, nos sonhos e nas lembranças do passado, ainda me
vejo menino, sentado no topo da montanha, olhando, em silêncio, para a linha do
horizonte e a solidão dos caminhos, à sombra das buganvílias.
Fernando de Almeida Silva
Fonte: iasdemfoco.net/
Nenhum comentário:
Postar um comentário