Se vivesse nos dias de hoje, o poeta Jean
Nicolas Arthur Rimbaud seria bombardeado pela mídia e perseguido pela opinião
pública, tal qual uma Amy Winehouse. Tido por muitos como a “voz do futuro”,
Rimbaud destacou-se pela precocidade e pelo estilo visionário de sua poesia.
Lembrado pela escrita agressiva e surtada, pela vida boêmia e por seu
relacionamento conturbado com o também poeta Paul Verlaine, Rimbaud abandonou a
literatura aos dezenove anos, deixando uma obra que, embora pequena, é
significativa e original, e acabou por influenciar diversos poetas das gerações
posteriores. Se vivesse nos dias de hoje, notícias como esta seriam comuns nos
jornais e sites:
Paris – Aos 18 anos, o poeta francês Arthur
Rimbaud se recupera de um dos capítulos mais polêmicos de sua trajetória de
bebedeiras e escândalos. Há duas semanas, o agitado envolvimento com o poeta
Paul Verlaine culminou no disparo de dois tiros, um deles acertando o punho
esquerdo de Rimbaud. Conhecido pelos acessos de raiva em público, pelas
noitadas intermináveis e pela parceria amorosa e poética, o casal tornou-se o
principal assunto dos tablóides e cadernos de fofoca da Europa.
Apesar de avesso a qualquer tipo de meio de
comunicação, Rimbaud aceitou receber a reportagem em sua residência, uma casa
simples localizada no subúrbio parisiense. Ainda com o punho enfaixado por
causa do incidente com Verlaine, Rimbaud sabe muito bem que todos os seus
passos são detalhados, analisados e criticados pela mídia de todos os lugares.
O poeta divide opiniões. Para uns, trata-se do grande gênio da poesia de nosso
tempo, aquele que fora iluminado pelas contradições e desgraças do mundo e
agora escreve compulsivamente em busca de uma saída para si e para os outros.
Há ainda os que o enxergam como um adolescente inconsequente que falsifica uma
inovação literária, e choca apenas por sua rebeldia.
Rimbaud também prefere se manter longe de
festas e rodas literárias (na última que participou, escandalizou os franceses
ao debochar dos outros escritores presentes). Nos últimos meses, enquanto
frequentavam bares e casas noturnas na periferia de Paris, ele e Verlaine eram
perseguidos pelos paparazzi e fãs lunáticos. Há algum tempo, os jornais
noticiavam que a relação dos dois passava por momentos delicados, marcados por
agressões e brigas homéricas.
De frente para a janela, sentado no único
sofá de sua sala de estar praticamente deserta, Rimbaud não parece muito
disposto a falar sobre Verlaine. Quando toco no assunto, o poeta é direto: “Eu
nunca poderei atirar o Amor pela janela.” Apesar de superficial, o ferimento
representa o estopim de uma paixão intensa e violenta. Pergunto-lhe se as
notícias a seu respeito o incomodam. Surpreendentemente, Rimbaud confessa: “O
meu maior medo é que os outros me vejam como eu os vejo. Imaginar o inferno é
ser inferno.” A declaração é inesperada, partindo de uma figura que nunca se
conteve em criticar a tudo e a todos.
O interesse pela forma pioneira de Rimbaud
escrever provoca curiosidade sobre seu processo criativo. Ele garante que
externar seus sentimentos de angústia e confusão não é fácil. “Ao princípio,
era apenas um exercício. Escrevia silêncios, anotava o inexprimível. Captava
vertigens. Depois, explicava os meus sofismas mágicos com a alucinação das
palavras!” Rimbaud é o ícone de uma geração de poetas voláteis e perdidos, que
cultivam o álcool e a fuga da realidade.
Sem se preocupar em dominar as perdições e
insanidades que coloca no papel, Rimbaud escreve sobre a cidade “monstruosa”, a
noite sem fim, as ruínas, os esgotos. O poeta é um voyeur da hipocrisia mundana
– e muitas vezes é agente das situações que descreve. “Fico à espera de ser um
louco muito perigoso. Trair o mundo seria uma tortura demasiado breve.” Após
conhecer o revolucionário francês, a impressão é a de que se trata de alguém em
estado permanente de incômodo, exilado de si mesmo.
Questiono Rimbaud sobre seus próximos
passos. Ele não cita a poesia, tampouco Verlaine. “Nadar, trincar erva, caçar,
fumar, fumar muito; beber licores abrasivos como metal fundente – como faziam
os nossos queridos antepassados em volta das fogueiras”, é o que planeja fazer
o poeta após a recuperação total de seu ferimento. Todos os interessados em
suas profecias acompanharão atentamente cada uma dessas ações. Afinal, eles
querem descobrir o segredo daquele que deseja “possuir a verdade numa alma e
num corpo.”
Fonte: http://acervo.revistabula.com/
Fonte: http://acervo.revistabula.com/
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