Tão
abstracta é a ideia do teu ser
Que
me vem de te olhar, que, ao entreter
Os
meus olhos nos teus, perco-os de vista,
E
nada fica melhor em meu olhar, e dista
Teu
corpo do meu ver tão longamente,
E
a ideia do teu ser fica tão rente
Ao
meu pensar olhar-te, e ao saber-me
Sabendo
que tu és, que, só por ter-me
Consciente
de ti, nem a mim sinto.
E
assim, neste ignorar-me a ver-te, minto
A
ilusão da sensação, e sonho,
Não
te vendo, nem vendo, nem sabendo
Que
te vejo, ou sequer que sou, risonho
Do
interior crepúsculo tristonho
Em
que sinto que sonho o que me sinto sendo.
Fernando
Pessoa, Cancioneiro
Nenhum comentário:
Postar um comentário